MEUS PARCEIROS

quinta-feira, 30 de julho de 2009

RECORDAR É VIVER

“Quero trazer à memória o que me pode dar esperança”
(Lamentações 3.21)

Lembro-me como se fosse hoje o dia em que conheci o lugar onde meu pai nasceu. Tinha vinte anos de idade. O sitio da família, onde eles plantavam mandioca para fazer farinha, ainda existia. Estar ali, naquele lugar, observar com viviam as pessoas, conversar com elas sobre o passado dos meus avós paternos foi muito importante. Muitos que conheceram meu pai menino e adolescente ainda moravam nas redondezas. Pude conversar com alguns deles. Disseram-me coisas importantes que ajudaram a compreender melhor meu velho e a respeitá-lo mais.

Conhecer o passado é fundamental para não perder a identidade. Recordar a história é necessário para alimentar a esperança em um futuro melhor. Por esta razão, ao comemoramos 106 anos da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, quero usar este espaço para recordar. Mesmo resumidamente quero trazer a memória o que pode dar esperança. Recordar, principalmente quem somos. Somos a IPI do Brasil, uma igreja cristã, reformada, calvinista, presbiteriana e brasileira.

Cristã porque somos um ramo da igreja inaugurada por Jesus Cristo. Reformada porque estamos ligados ao movimento da Reforma Religiosa do Século XVI, liderada por Matinho Lutero. Calvinista porque nossa tradição doutrinária e litúrgica está vinculada ao reformador francês João Calvino, um intelectual brilhante e interprete sério da Bíblia, que aprofundou a reforma de Lutero. Presbiteriana porque adotamos a forma de governo representativa, centralizada nos concílios formados por presbíteros eleitos pela igreja e por pastores. Brasileira porque somos frutos de um movimento nacionalista que surgiu dentro da Igreja Presbiteriana do Brasil no inicio do século XX.
Foi no dia 31 de julho de 1903 que pastores e presbíteros nacionalistas, liderados pelo Rev. Eduardo Carlos Pereira, organizaram a IPI do Brasil. Entendiam que chegara a hora de caminhar utilizando recursos próprios sem a tutela da Igreja Presbiteriana dos EUA. Somos “independentes” porque desenvolvemos nossas atividades emancipados da igreja mãe. Aliás, somos a primeira igreja evangélica nacional. Hoje somos mais de quinhentas igrejas espalhadas pelo Brasil ligadas pelos laços da Reforma, do calvinismo, do presbiterianismo e do “31 de julho”.

Mas, além do nosso aniversário, precisamos também trazer à memória dois fatos. Os 500 anos do nascimento de João Calvino (10/07/1509) e os 150 anos da chegada ao Rio de Janeiro do Rev. Ashbel Green Simonton, missionário norte-americano que fundou a Igreja Presbiteriana do Brasil (12/08/1859). Neste “31 de julho” se queremos expressar nossa gratidão a Deus, devemos fazê-lo reafirmando nossa identidade calvinista e presbiteriana. Temos uma história, um passado que não nos envergonha, mas dá-nos esperança quanto à realização da missão de Glorificar a Deus. Amém!


Soli Deo Gloria
Rev. Ezequiel Luz

sábado, 25 de julho de 2009

PRECISA-SE DE PROFETAS

Não havendo profecia, o povo se corrompe; mas o que guarda a lei, esse é feliz. (Pv 29.18)

Domingo após o culto fomos a uma pizzaria. Um garçom negro com aparecia bem jovem nos atendeu com muita presteza. Quando a pizza chegou perguntei-lhe:
─ Quantos anos você tem?
─ Quatorze, Senhor!
─ Mas você é muito jovem. Você pode trabalhar?
─ Eu trabalho aqui como aprendiz.
­─ Mas é domingo e já passa das 10 horas.
─ Eu sei Senhor, mas eu preciso do emprego.
Ele serviu a pizza! Comemos enquanto falávamos sobre o culto. Fechamos a conta e na hora de sair cumprimentei o jovem garçom e disse:
─ Tudo bem! Você pode trabalhar, mas estuda.
─ Claro Senhor. Estou cursando o primeiro ano do ensino médio e quero fazer medicina.
─ Ótimo, meu rapaz. Coragem! Vá em frente e estude bastante.
No caminho para casa comentei com os meus filhos sobre a atitude do garçom. Lembramos de um documentário exibido na TV onde um jovem com doze anos disse ao repórter que queria ser traficante quando crescesse. Então comentei com minha família. Os dois são pobres e têm um alvo na vida. Qual deles tem mais chance de realizar o sonho?
Para um mundo totalmente injusto somos chamados a profetizar. No entanto hoje temos louvor profético, dança profética, cobertura profética, identidade profética, ato profético, ministério profético, mas não se conhece o que é ser profeta. Na Bíblia profeta não é aquele que adivinha o futuro, mas aquele que, movido por uma experiência espiritual, discerne os desígnios de Deus para o povo. O profetismo bíblico surgiu com Samuel e se destacou com Elias e Eliseu. Porém, foi no século VIII a.C. com Amós, Oséias, Isaías, Miquéias, que ele mais se sobressaiu. Depois a profecia passou por um período de profundo declínio, até que na plenitude dos tempos apareceu o profeta da esperança, da justiça, da graça de Deus, chamado Jesus de Nazaré.
Ao estudarmos a vida dos profetas, observamos que, orientados por Deus agiam com coragem e denunciavam a injustiça, a corrupção, o pecado de quem quer que fosse. Sem a orientação de Deus, sem profecia o povo se corrompe. Para uma sociedade que facilita o caminho de um jovem que quer ser traficante e impede que outro realize o sonho de ser médico, precisamos de coragem profética. Precisamos dizer que tal sociedade está debaixo da ira de Deus. Precisamos chamá-la ao arrependimento e a corrigir o seu caminho.
Que o Senhor nos dê profetas! Amém!

Soli Deo Gloria
Rev. Ezequiel Luz

Ilustração: Escultura do profeta Amós de Aleijadinho.

sábado, 18 de julho de 2009

CALVINO: INTRANSIGENTE OU OBEDIENTE

E Paulo terminou, dizendo: (...) eu não desobedeci à visão que veio do céu.(At 26.19)

Como parte das comemorações dos 500 anos do reformador João Calvino, a Folha de São Paulo publicou no dia 12 de julho, um artigo escrito pelo professor Antonio Flávio Pierucci, chefe do departamento de Sociologia da USP, intitulado “Calvino, 500”. O fato de um jornal com a maior circulação no Brasil, segundo o ranking da ANJ (Associação Nacional de Jornais), dedicar duas páginas a Calvino revela sua grande importância. Mas quem ler o texto provavelmente ficará com uma imagem destorcida de João Calvino.

Logo no inicio é dito que Pierucci fará uma análise da obra do reformador que levou a teologia a seus limites lógicos e sacrificou a ideia de um Deus amoroso. Depois o articulista da Folha afirma que para resolver a questão da dúvida metafísica sobre origem do mal, Calvino realizou uma proeza racional. “Foi preciso o destemor conceitual de um teólogo exigente feito ele (que, segundo biógrafos, ensinava como se fosse refém de uma inclinação pessoal obsessivo-compulsiva a pensar com lógica a teologia) para dar o passo racional necessário. Ousou: para salvar a onipotência de Deus, não dá para não sacrificar pelo menos um quê da bondade divina”. Pieruchi demonstrando certo asco chega a dizer: “Quase dantesco, soando às vezes satírico, Calvino deixou de lado todo prurido “bela alma” e saiu rasgando o véu da compaixão católica e luterana pelo “pobre pecador”, dando espaço em suas obras à crueza catastrofista do monoteísmo vingador dos profetas bíblicos”. Esta á a visão que a maioria dos intelectuais tem de Calvino. Um homem frio, extremamente racional, obcecado e intransigente.

Também os evangélicos pentecostais e neopentescostais alimentam certa antipatia por causa da concepção da predestinação sistematizada por Calvino em sua teologia da graça. É um erro lamentável reduzir o calvinismo à predestinação. A preocupação central de Calvino era com a glória de Deus. Aliás, em uma época em que a igreja se esquece do seu papel de expressar a glória de Deus e se volta para a satisfação das necessidades individuais e imediatas, a ênfase de Calvino é urgente e necessária.

Portanto, a dívida de todos nós, históricos, reformados ou não, para com João Calvino é imensa. No culto de abertura da 6ª Assembleia Geral da IPI do Brasil, o Rev. Gerson Correia de Lacerda, com base em Atos 26.1-20, traçou um paralelo entre Paulo, Calvino e os missionários calvinistas que vieram ao Brasil em meados do século XVII. Todos foram fieis e obedientes a vontade de Deus encontrada nas Escrituras. Àqueles que descrevem Calvino como um homem intransigente, a igreja reformada deve apresentar o interprete das Escrituras, fiel e obediente ao seu Deus.


Soli Deo Gloria
Rev. Ezequiel Luz

quinta-feira, 9 de julho de 2009

A VIDA E A MORTE

“Vê que proponho, hoje, a vida e o bem, a morte e o mal; (...) escolhe, pois, a vida, para que vivas, tu e a tua descendência” (Dt 30.15,19)

Entre os anos 50 e 60 do século passado, um jovem americano de nome Caryl Chessman foi acusado pelo estado da Califórnia de ser o “Bandido da Luz Vermelha”. Pesava sobre ele a acusação de ser o responsável por uma série de assassinatos bárbaros. Algumas das vítimas, que sobreviveram, disseram que o homem usava uma lanterna de sinalização vermelha para atacar suas vitimas. Chessman correspondia à descrição do criminoso, o que aliado ao seu passado fértil em transgressões à lei, foi suficiente para, em meio à comoção causada pelos crimes de que foi acusado, ser condenado por um Tribunal do Júri em que dos doze jurados onze eram mulheres.

Mesmo negando responsabilidade pelos crimes que lhe foram imputados, foi condenado e recolhido à cela nº 2455, da Penitenciária de San Quentin. Durante doze anos frequentou o corredor da morte em função dos recursos e petições a tribunais da Califórnia e à Corte Suprema dos EUA. Conseguiu adiar por sete vezes a data para sua execução. Nesse período estudou Direito e escreveu três livros: "2455 - a Cela da Morte", "A Face da Justiça" e "O Garoto era um assassino". Lutou pela vida tentando sensibilizar autoridades e a opinião pública quanto à sua inocência. Não conseguiu! No dia dois de maio de 1960, às 10h12, com 38 anos, foi executado na câmara de gás, minutos antes de uma última e tardia intervenção do governador da Califórnia.

A Bíblia ensina que Deus criou-nos para a vida. O próprio Jesus disse que ele veio para que tivéssemos vida e vida em abundância. Mas a entrada do pecado na existência humana trouxe, como conseqüência, a morte. Hoje vida e morte são realidades que todos nós enfrentamos. Lutar pela nossa sobrevivência passou a ser inerente à nossa existência. No deserto Moisés propôs ao povo de Israel a escolha entre a vida e a morte. Fez um forte apelo a que escolhessem a vida pra que eles e toda a descendência tivessem vida.

Também hoje, estando em um mundo marcado pela morte, somos desafiados a escolher a vida. Escolher a vida significa uma decisão de amar, obedecer e apegar-se a Deus acima de todas as coisas. Tal decisão tem também uma implicação profética: de levar-nos a denunciar toda e qualquer forma de injustiça geradora de morte.

Irmãos escolham a vida para que vivam! Amém!
Soli Deo Gloria
Rev. Ezequiel Luz

sábado, 4 de julho de 2009

ANJO E CAFETÃO

Não amem o mundo, nem as coisas que há nele. Se vocês amam o mundo, não amam a Deus, o Pai.(1Jo 2.15 NTLH)

Na quinta-feira 25, do mês passado, morreu em Los Angeles Michael Jackson, a maior estrela pop de todos os tempos. Assim que sua morte foi confirmada a mídia se encarregou de publicar uma infinidade de textos e imagens sobre a vida do rei do pop. Nenhum outro artista contemporâneo encarnou, com tanta evidência, o conflito entre público e privado. Não foi apenas durante o período em que se envolveu com acusações de pedofilia. Durante a infância, o cantor viveu a ruptura entre uma rotina de aparições felizes diante das câmeras e uma realidade familiar marcada pela violência e pela exploração.

Nos últimos dias muito se falou sobre Joseph, o pai autoritário. O homem que tentou se dar bem como músico e acabou empresário e feitor dos filhos. Quando um deles arrebentou a corda de sua guitarra tentando tocá-la, percebeu que eles poderiam brilhar, então passou a prepará-los. Se não ensaiassem o suficiente, se não se apresentassem bem, levavam uma surra. Michael, a estrela do grupo, apanhava mais. Dirigia-se aos meninos com xingamentos e só se acalmava quando o Michael começava a cantar e a dançar. O rapaz cantava como um anjo e dançava como um cafetão. Ainda criança fazia shows em prostíbulos, bares e teatros. Quando se deprava com crianças brincando sentia vontade de se juntar ao grupo, mas não podia por causa dos ensaios e dos compromissos.

A maneira como foi criado produziu uma personalidade indefinida. Michael Jackson não tinha uma cor definida. Não tinha uma face definida. Não tinha uma sexualidade definida. Não tinha uma saúde definida. Não era adulto e nem criança. Não era homem e nem mulher. No palco tinha uma energia impressionante, na vida privada uma saúde frágil. Ganhou fama, poder, riqueza, mas perdeu sua identidade em algum lugar dentro do conflito entre a vida pública e a vida pessoal, entre o anjo e o cafetão.

Michael Jackson deixa-nos, além do legado da sua arte, uma lição para a família e para a igreja. A família deve entender que uma liderança que exige dos filhos desempenho perfeito em todas as áreas pode até levá-los ao sucesso na vida profissional. Mas certamente perderão a identidade familiar e viverão sérios conflitos emocionais. A igreja deve entender que deixar-se conduzir pela visão empresarial, adotando práticas produzidas pelos marqueteiros da fé, poderá até levá-la a um grande sucesso, a ter seus templos lotados. Mas perderá sua identidade cristã. A identidade com a Trindade, o Deus relacional.

Portanto, não vale a pena tanto empenho para obter o sucesso que o mundo ama. Quem ama o mundo e o que há no mundo o amor de Deus não está nele. Pense nisso!
Soli Deo Gloria
Rev. Ezequiel Luz